8 de fevereiro de 2015

Estou aqui


Alguns inquisidores têm perguntado nas redes sociais onde estariam os eleitores de Dilma. Bom, pelo menos no que diz respeito a mim, posso dizer que estou aqui onde sempre estive. É preciso alertar, no entanto, caso alguém ainda não tenha percebido, que o processo eleitoral terminou. Está aí, claramente, a razão pela qual tenho feito menos postagens relacionadas ao governo do que fazia em meados de outubro passado. Naquele momento, eu tinha a intenção de convencer as pessoas a acompanharem minha escolha. Hoje, por um motivo óbvio, isso não é mais necessário. Outros de seus eleitores devem estar por aí, em situação semelhante. Todos aqueles com os quais tenho alguma proximidade continuam deixando clara sua opção. Outros devem ter reavaliado seu posicionamento, assim como devem ter feito vários eleitores de Aécio. Porém, o que quero mesmo destacar aqui é que se faz urgente interromper esse clima extremamente prejudicial de “caça às bruxas”.

Não é nenhuma novidade que a maioria das postagens que circulam pelas redes sociais são extremamente simplistas, muitas delas falsas e distorcidas. O ritmo frenético de publicação de novidades (nem sempre tão novas) estimula um alto grau de superficialidade. Essas redes possuem grandes vantagens, como a possibilidade de trocas de informações e ideias, capazes de levar a entendimentos positivos. O grande problema é que, quando o assunto é um pouco mais sério, no sentido de ter impactos importantes sobre a vida das pessoas, esse comportamento pouco aprofundado acaba por descambar para um fundamentalismo boboca, que, como consequência, pode incentivar ações muito pouco construtivas ou, pior ainda, destrutivas e retrógradas.

Não defendo de forma incondicional nenhum político, partido ou figura pública. Tenho muitas críticas ao atual governo, mas também sei reconhecer os aspectos positivos, principalmente aqueles ligados ao combate à miséria, à pobreza e à desnutrição (com reconhecimento pela ONU), ao respeito à democracia, à preservação do emprego e à valorização da renda, ao investimento em infraestrutura, a políticas de inclusão, entre outros. Percebo claramente os erros cometidos, principalmente na área econômica, inclusive aqueles que podem chegar a ameaçar algumas das conquistas citadas, se não forem feitos os devidos ajustes. Ajustes estes que, provavelmente, estariam sendo feitos de qualquer forma, independente do candidato eleito. Porém, possivelmente, com foco e intensidade diferentes.

Em um país grande como o Brasil, sabemos que é muito difícil agradar a todos os setores. O câmbio apreciado gera a reclamação de alguns, mas a depreciação gera grita por parte de outros. Impostos sobre importação, do mesmo modo, apesar de produzirem seus descontentes, contam com o apoio de grande parte do setor produtivo. Impostos mais específicos, como a CIDE (sobre combustíveis), se forem implementados de maneira setorizada, voltados, por exemplo, para a área de logística (neste caso da CIDE), são muito interessantes e podem representar grandes avanços, como fizeram no passado, inclusive na era FHC (antes das imposições do FMI). Mas se forem jogados de modo genérico no caixa do governo, já não contam tanto com o meu apoio (não porque não pudessem servir para investimentos importantes, mas sim devido ao menor impacto na verdadeira alavancagem da economia).

Por isso, acho que não devemos analisar cada medida isoladamente, mas sim o conjunto e o resultado delas. Farei a avaliação do segundo mandato em todo o seu decorrer e, lá na frente, quando chegarem as eleições, irei considerar as opções disponíveis. Afinal, não tem jeito: eleição é, inescapavelmente, comparação. E assim foi o último pleito, como todos os outros: dentre as opções disponíveis, julguei que Dilma fosse a mais apta para fazer um governo melhor e mais próspero para a maioria da população. Passou-se pouco tempo desde então, já tenho elogios e críticas às primeiras medidas, indicações e sinalizações deste novo mandato. Mas, se as eleições fossem repetidas hoje, eu a escolheria novamente. Não porque eu morra de amores por ela ou por seu partido, e sim porque considerei que as alternativas apresentadas eram piores.

Algumas pessoas chegaram a manifestar vergonha pelo voto alheio ou luto pelo país logo após a divulgação dos resultados do processo eleitoral. Arrisco-me a dizer que esses indivíduos não teriam agido de maneira tão rasa se soubessem o que é um luto de verdade, com o todo o sofrimento aí implicado. Mas, retirando o aspecto ridículo desse tipo de manifestação, o que resta é muito pouco ofensivo. O que realmente pode ofender e desrespeitar são os ataques que procuram taxar de “burro”, “bovino” ou “alienado” o eleitor que fez uma opção diferente. Trata-se, inclusive, de uma demonstração de ignorância, pois desconhece o apoio de inúmeros representantes importantes da intelectualidade brasileira e até internacional à então candidata petista. Incluem-se aí, provavelmente, até mesmo personalidades admiradas pelos autores das críticas infundadas, apesar de eu ter visto alguns casos de pessoas que decidiram trocar antigas admirações por figuras menores, como pastores radicais e jovens colunistas de aluguel, em consequência de uma simples opção eleitoral divergente. Pior ainda são aqueles que acusaram os eleitores dilmistas de alguma cumplicidade com malfeitos, ignorando por completo os escândalos nos quais vários tucanos chafurdaram ao longo dos últimos anos, como o mensalão em Minas, a lista de Furnas, o trensalão, a privataria, a compra de votos para a reeleição, os aliados na diretoria da Polícia Federal e nos Tribunais de Contas, o “Engavetador Geral da República” no Ministério Público, o caso do Banestado, da Repsol, da Pasta Rosa, do SIVAM, entre tantos outros.

Por isso, não se arvore em “geniozinho da política”, dono da verdade ou de um intelecto superior, pois isso todos sabemos que você não é. Apesar das discordâncias, o respeito pela opinião alheia é fundamental. Afinal, não sei se outro candidato eleito poderia estar fazendo um governo melhor ou pior. E ninguém mais sabe, pois é impossível sabê-lo, principalmente se considerarmos os desmandos que conhecemos bem e que afetam praticamente todas as correntes mais fortes da política nacional. A inépcia das gestões tucanas em mais de duas décadas à frente do governo de São Paulo desencadeou graves crises no abastecimento hídrico, no setor elétrico e na capacidade de expansão da rede metroviária. Neste último caso, a causa principal foi um intrincado esquema de corrupção. Em Minas, uma aliança espúria com a mídia ajudou a esconder sérios problemas de planejamento e os efeitos declinantes daquilo que chamaram de “choque de gestão”.

Precisamos mesmo é aprender a encarar com maturidade as questões cruciais que se colocam à nossa frente, ao invés de agirmos como se estivéssemos em uma interminável campanha eleitoral. É preciso reconhecer a complexidade dos desafios e do cenário no qual deveremos enfrentá-los. Conseguiremos fazer progresso nos aparentes consensos que não avançam? Faremos as reformas política e tributária? Esses “consensos” são assim tão “consensuais”? Financiamento público de campanha? Voto em lista? Taxação de grandes fortunas? Impostos progressivos? Retorno da CPMF, com destinação exclusiva para a saúde? Avançaremos na regulamentação da mídia e do consumo de maconha, como fizeram outros países da América Latina, da Europa e até os Estados Unidos? Nos preocuparemos com a grande influência do poder econômico? Tomaremos medidas para evitar que a concentração de renda ameace a democracia?

É importante ter em mente que, em geral, os eleitores desejam mais ou menos as mesmas coisas, independente dos candidatos que escolheram: serviços públicos de qualidade, justiça ágil e imparcial, igualdade de oportunidades, respeito às liberdades. Discordam quanto a alguns dos métodos, mas concordam quanto a outros. Por isso, não há motivos para o desrespeito ou para o radicalismo. O problema não pode ser, simplesmente, a pessoa que está democraticamente incumbida de administrar as políticas públicas. A atitude de fazer ataques constantes a toda e qualquer medida do governo, como se não houvesse nada de positivo e, pior ainda, como se não houvesse a menor possibilidade de realização de algo assertivo, sempre irá cheirar a pura implicância. Um cansativo chororô.

Seria muito edificante se os embates fossem entre ideias, e não entre pessoas. É claro que as críticas são importantíssimas. Não desejo, de modo algum, uma população acrítica e passiva. Mas é imprescindível algum grau de construtividade, que se contraponha às reclamações vazias e incondicionais. Acompanhemos, fiscalizemos, cobremos. Denunciemos os desvios e abusos. Critiquemos os aspectos dos quais discordamos, mas destaquemos e estimulemos aqueles com os quais estamos alinhados. Torçamos pelo melhor. Sem perseguições idiotas, principalmente contra eleitores.

O nível de atenção pela política parece estar aumentando entre a população e isso poderá ser muito proveitoso para o país. Entretanto, ainda estamos em um estágio no qual pessoas que desconhecem as responsabilidades que cabem a cada esfera administrativa ou a cada um dos diferentes poderes da República sentem-se no direito de tratar com enorme descortesia aqueles que fizeram escolhas diferentes. Trata-se de um grande erro a ideia de que o eleitorado de um candidato compõe um grupo coeso e indissociável. Esses grupos são circunstanciais: constituem-se no momento do voto, mas desfazem-se logo em seguida. Não formam movimentos que se expandem para além do processo eleitoral. Nem Aécio nem Dilma mantêm cativos os donos dos votos que receberam. Os responsáveis por esses votos sequer existem ainda como grupos.

Somos tentados a achar que a prevalência de nossas escolhas seria a solução para todos os problemas. Nada mais distante da realidade. A opção por determinada corrente política em uma eleição é resultante de nossas opiniões pessoais, que, por sua vez, são consequência de nossas observações e conhecimentos. Tais opiniões têm o mesmo valor do que as de outras pessoas. Elas nem têm suas diferenças completamente aferidas na prática, visto que a alternativa derrotada não chega a ser implementada. Por isso, ficar repetindo o nome do candidato para o qual depositou seu voto não lhe torna uma pessoa melhor e nem lhe confere alguma superioridade. O necessário reconhecimento de que sempre se pode estar errado é o primeiro grande passo para o respeito.

Como possuo um grande interesse por política, há bastante tempo, continuarei a postar mensagens relacionadas ao assunto. Isso se dará, obviamente, em um ritmo bem menor do que aquele observado durante as eleições. Em alguns momentos, provavelmente, farei críticas a certas medidas governamentais. Em outros, destacarei aspectos positivos, inclusive para fazer um contraponto às críticas mais exageradas ou distorcidas. É como disse Luis Fernando Verissimo, em certa ocasião, numa entrevista para a tevê: às vezes, os ataques ao governo são tão desproporcionais e excessivos que, mesmo discordando de vários de seus aspectos, sentimo-nos impelidos a defendê-lo. Até para tentar trazer a percepção geral para algo mais próximo do real, visto que, muitas vezes, acaba-se por pintar uma situação tão caótica que, assim como o país das maravilhas de certos defensores, só existe nos delírios de alguns.

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